2 de abr. de 2013

Desenvolvimento e Aprendizagem: Implicações para o Trabalho na Sala de Aula

A tese da educação como valor universal coloca a discussão sobre difusão do conhecimento matemático como um pêndulo que oscila entre o objetivismo e o subjetivismo. Assim, há momentos em que se nota ênfase nos fatores externos ao desenvolvimento e à aprendizagem; noutros, os determinantes da relação são fatores internos e há aqueles momentos em que se nota uma tendência a aceitar a idéia de dissociação entre desenvolvimento e aprendizagem.

 Essa dicotomia entre desenvolvimento e aprendizagem traz conseqüências para a organização dos programas de ensino. De fato, o conhecimento matemático não se consolida como um rol de idéias prontas a ser memorizado; muito além disso, um processo significativo de ensino de Matemática deve conduzir os alunos à exploração de uma variedade de idéias e de estabelecimento de relações entre conceitos de modo a incorporar os contextos do mundo real, as experiências e o modo natural de envolvimento para o desenvolvimento das noções matemáticas com vistas à aquisição de diferentes formas de percepção da realidade. Mas ainda é preciso avançar no sentido de conduzir as crianças a perceberem a evolução das idéias matemáticas, ampliando a compreensão que delas se tem.


Isso posto, a tese da educação como valor universal questiona o inatismo que justifica as diferenças individuais com determinantes biológicos e tenta demonstrá-lo mediante testes de inteligência, de aptidão, de prontidão, etc. Noutro sentido, ao buscar a compreensão do crescimento dos indivíduos, a discussão tende a deslocar o pêndulo para o espectro da tese ambientalista que encontra na família, no ambiente social e na cultura os fatores determinantes do desenvolvimento humano.


 A dicotomia apontada traz conseqüências metodológicas que oscilam entre tentativas de compreensão de “como se ensina” ou de “como os alunos aprendem” Matemática. Nesse estudo, pautamos nossa compreensão no sentido da indissociabilidade entre desenvolvimento e aprendizagem posto que (...) o aprendizado não é desenvolvimento; entretanto, o aprendizado adequadamente organizado resulta em desenvolvimento mental e põe em movimento vários processos de desenvolvimento que, de outra forma, seriam impossíveis de acontecer.


Assim, o aprendizado é um aspecto necessário e universal do processo de desenvolvimento das funções psicológicas culturalmente organizadas e especificamente humanas. (VYGOTSKY, 1989, p. 101). Ainda que constituam conceitos distintos, desenvolvimento e aprendizagem são profundamente interdependentes. Essa articulação vem sendo discutida desde o início do século XX e ainda assim é possível notar nas tentativas de reformas curriculares, artigos e propostas de cursos um conjunto de idéias que indicam a presença dessa dificuldade de mudança conceitual. Não atentar para a relação entre desenvolvimento e aprendizagem traz conseqüências para a prática pedagógica e para a forma de organização curricular. Não permite perceber que o processo de conhecimento não é linear nem progressivo.


 A experiência escolar com a ciência matemática é uma ação que vem se somar ao fazer do indivíduo, isto é, insere-se em um processo de desenvolvimento que se iniciou antes da escolarização de modo que o sujeito já detém certas formas de atividade matemática e já faz uso tanto de sistemas expressivos como simbólicos. Como exemplo, considere-se que diversos experimentos desenvolvidos por Vygotsky demonstraram, dentre outras coisas que, para as crianças, falar é tão importante como atuar quando se propõem uma meta; além disso, quanto mais complexa é a experiência e menos direta sua solução, mais importante resulta a linguagem na realização da operação.


 Por conseqüência, o desenvolvimento das habilidades lingüísticas deveria se realizar em conjunto com as atividades matemáticas o que traria conseqüências para o planejamento das ações nas escolas. Isso posto, registre-se as contradições de se organizar classes de reforço de séries iniciais pautados apenas na busca de compreensão dos processos de leitura e escrita, como se o fato matemático não se caracterizasse como dimensão fundamental da linguagem, sem o qual o processo de alfabetização simplesmente não se consolidaria. Para além das dimensões científica e tecnológica, a Matemática se consolida como componente da cultura geral do cidadão que pode ser observada na linguagem corrente, na imprensa, nas leis, na propaganda, nos jogos, nas brincadeiras e em muitas outras situações do cotidiano.


Resumidamente, a discussão sobre o problema da formação de conceitos matemáticos deve considerar como teses centrais da ação na situação de ensino e de aprendizagem as perspectivas de:


 a) Contextualização : consideração no trabalho pedagógico com Matemática dos aportes socioculturais do alunado para se considerar na escola situações vivenciadas pelos alunos fora dela, o que se poderia denominar de matemática cultural, isto é, as diversas formas de matematização desenvolvidas pelos diversos grupos sociais, de modo a permitir a interação entre essas duas formas de pensamento matemático.


 b) Historicização : mostrar aos alunos a forma como as idéias matemáticas evoluem e se complementam formando um todo orgânico e flexível, é pressuposto básico para se compreender a Matemática como um processo de construção.


 c) Enredamento: organização das idéias matemáticas em articulação com as diversas áreas do conhecimento posto que elas não surgem do nada; pelo contrário, muitas idéias matemáticas nem surgiram em contextos exclusivamente matemáticos. Talvez a principal implicação de uma proposta de formação de conceitos em Matemática seja a compreensão do educador como mediador do processo de construção do conhecimento, criando situações pedagógicas para que a criança exercite a capacidade de buscar soluções para os problemas apresentados.


Através de ações sobre os objetos, descobrindo relações, estruturando o seu pensamento lógico, especialmente no que respeita às noções de quantidade e medida e exploração sensorial do mundo físico, é que a criança logrará condições para evolução da representação simbólica da Matemática. A preocupação em discutir as diretrizes de um processo de ensino de Matemática situado na perspectiva da formação de conceitos impõe considerar a dinâmica de trabalho desenvolvida por professores e alunos bem como indicar os princípios metodológicos norteadores dessa ação.


 A formação de conceitos e as dificuldades para inovações curriculares As idéias de contextualizar, historicizar e enredar, teses centrais de um processo de formação de conceitos matemáticos, se mostram presentes, embora de maneira pouco explícita, nas tentativas de renovação do ensino da Matemática no contexto brasileiro. A dificuldade na implantação das reformas curriculares é um problema crônico do sistema de ensino em todos os níveis por serem tomadas como decisões centralizadas, sem a participação mais efetiva dos professores. Todos os diagnósticos sobre o ensino de Matemática apontam para dificuldades de compreensão das diretrizes emanadas das recentes tentativas de reformas curriculares. Dentre essas dificuldades, cumpre destacar:


 a) conhecimento parcial das teses da reforma curricular e das diretrizes pedagógicas emanadas dos PCN de Matemática pelo conjunto dos professores;


 b) desenvolvimento parcial das diretrizes curriculares, via de regra, adequando-se os programas de Matemática tal como propõe a reorganização curricular, mas apontando dificuldades para a veiculação do conteúdo na forma metodológica indicada;


 c) os professores consideram a metodologia e a seleção dos conteúdos como adequadas, embora apontem dificuldades para suas veiculações na sala de aula de forma sistemática;


 d) organização linear dos programas e dificuldade para perceber o currículo como um todo organizado sistematicamente, mas de forma flexível;


 e) a linguagem utilizada nos documentos dificulta a compreensão das questões pedagógicas relevantes envolvidas e, até mesmo, a sua leitura ;


 f) a falta de apoio técnico-pedagógico, o tempo restrito para o preparo das aulas e a participação tímida dos professores na elaboração das propostas curriculares como entraves para divulgação de suas teses e para a implementação das diretrizes apontadas;


 g) condicionamento da implementação prática das reformas curriculares de Matemática à orientação técnico - pedagógica adequada;


 h) dificuldades para o estabelecimento de relações entre o proposto na reforma curricular paulista (1986) e as disposições contidas nos Parâmetros Curriculares Nacionais. BRUNER (1978) considera que o ensino e a aprendizagem da estrutura, mais do que o simples domínio de fatos e técnicas, está no centro do clássico problema da transferência, isto é, se o sujeito conhece uma situação-problema A e se vê diante de uma situação-problema B que guarda relação direta com a primeira, só haverá aprendizagem de fato se ele consegue dar esse salto qualitativo no sentido de tirar conclusões que não estavam explícitas naquela.


 Já se apresenta como consensual o fato de vivermos um tempo no qual a pressão social sobre a escola é acentuada no sentido de que a formação de nossos alunos cuide do desenvolvimento de um número considerável de habilidades de pensamento, indo muito além dos conhecimentos específicos e dos procedimentos. Essa mudança de atitude na escola exige romper paulatinamente com um fazer pedagógico centrado excessivamente na figura do professor.


Reveste-se de relevância à medida em que todas as pesquisas sobre o cotidiano da escola apontam para a força das relações interpessoais na concretização das inovações curriculares. A pesquisa em Educação Matemática já definiu que ao organizar as idéias matemáticas exclusivamente segundo o critério da precedência lógica, característica decorrente das influências daquele modelo formal, o fazer pedagógico tradicional na escola desconsidera todos os demais aspectos psicológicos, sócio - econômicos e culturais envolvidos na criação matemática.


 O aluno, quando interpreta dados e informações, o faz dentro de um referencial cujo aspecto mais fundamental é o histórico de suas experiências anteriores. A dissociação entre a forma e o conteúdo do ensino de Matemática não permite aos alunos apreender a estrutura de um assunto; apreender tal estrutura significa aprender como as coisas se relacionam. Pensar em aprendizagem significativa implica assumir o fato de que aprender pressupõe uma ação de caráter dinâmico, o que requer ações de ensino direcionadas para que os alunos aprofundem e ampliem os significados que elaboram mediante seus envolvimentos em atividades de aprendizagem.


Daí que o mais importante no ensino de conceitos básicos é ajudar a criança a passar progressivamente do pensamento concreto à utilização de modos de pensamento conceptualmente mais adequados. É ocioso, porém, tentar fazê-lo pela apresentação de explicações formais, baseadas numa lógica muito distante da maneira de pensar da criança e, para ela, estéril em suas implicações.


(BRUNER, 1978, p. 36). Por isso, o uso dos recursos da comunicação nas aulas de Matemática justifica-se porque ao comunicar idéias e maneiras de agir, os alunos precisam refletir sobre o que fizeram ou pensaram, construir esquemas mais elaborados de pensamento, organizar pensamentos e ações, para avançar com competência no processo de conhecimento.


 Além do exposto, as habilidades relacionadas à comunicação, como falar, ler, escrever, desenhar e as habilidades relacionadas ao fazer matemático podem desenvolver-se uma auxiliando a outra, uma como alternativa de acesso à outra, em processo dialético de complementaridade.


Isso posto, em função dessas premissas concernentes à articulação entre teoria e prática em ensino de Matemática, analisamos, a seguir, alguns aspectos específicos dos programas dessa área do conhecimento cujo desenvolvimento implica na consideração de ações pedagógicas fundamentais para uma mudança de postura nas práticas escolares no contexto do processo ensino – aprendizagem da Matemática.

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